A anemia ocorre como resultado da queda da contagem de glóbulos vermelhos (eritrócitos) abaixo dos valores mínimos necessários para garantir o suprimento adequado de oxigênio aos tecidos.
As anemias hemolíticas (quando os glóbulos vermelhos são destruídos) são uma das principais causas de morbidade e mortalidade em gatos, com prognóstico variável, dependendo da causa associada e da gravidade do caso. Nesta postagem, vamos nos concentrar em entender as principais causas de anemia hemolítica em gatos e discutir os tratamentos disponíveis.
Diagnóstico da anemia hemolítica em gatos: origem imune vs. não imune
Em felinos, a anemia hemolítica pode ser classificada da seguinte forma:
A. Anemia hemolítica adquirida:
Nessa categoria, os glóbulos vermelhos do paciente são normais até que uma doença ou algum outro fator desencadeie a destruição dos glóbulos vermelhos. Destacam-se todas as causas associadas à anemia hemolítica imunomediada (AHIM), na qual são gerados autoanticorpos que têm como alvo epítopos localizados nas membranas das hemácias, desencadeando a hemólise. Em alguns casos, os anticorpos também atacam as células progenitoras dos glóbulos vermelhos, de modo que o diagnóstico de AHIM pode estar associado à anemia regenerativa ou não regenerativa.
As condições que podem aumentar o risco de desenvolver AHIM incluem:
- Disfunção do sistema imunológico (inclusive AHIM idiopática).
- Infecções pelo vírus da imunodeficiência felina (FIV), leucemia viral felina (FeLV) ou peritonite infecciosa felina (FIP).
- Hemoparasitas, como Mycoplasma haemofelis ou Cytauxzoon felis.
- Em resposta à exposição a produtos químicos, toxinas ou reações a medicamentos.
- Lúpus eritematoso sistêmico.
- Doação de sangue incompatível.
- Tumores (linfoma maligno).
B. Anemia hemolítica hereditária:
Essa anemia está associada a distúrbios genéticos ligados à produção de eritrócitos e é evidenciada pela circulação de eritrócitos anormais ou frágeis. Nos gatos, a deficiência hereditária da enzima piruvato quinase causa eritrócitos fracos e é mais frequente em algumas raças (Somali e Abissínio). Outro exemplo é o de pacientes diagnosticados com Porfiria, em que se observa a diminuição da função das enzimas necessárias para a biossíntese do grupo heme. O tratamento de condições genéticas geralmente envolve opções caras e altamente especializadas, incluindo transplante de medula óssea combinado com tratamento sintomático para diminuir os efeitos da doença.
C. Outras causas:
A isoeritrólise neonatal é causada pela ingestão de colostro materno contendo isoanticorpos que agem contra os eritrócitos do neonato. Nesses casos, a ingestão de colostro deve ser interrompida e o tratamento de suporte, incluindo transfusão de sangue, deve ser fornecido.
Em gatos com diabetes, doença hepática degenerativa ou distúrbios gastrointestinais que comprometem a absorção de nutrientes, uma possível causa de anemia hemolítica é a hipofosfatemia. Nesses casos, é possível desenvolver uma deficiência grave de fosfato no sangue, manifestada por anormalidades hematológicas (hemólise associada a níveis reduzidos de 2,3-DGP e ATP). Os níveis de fósforo devem ser monitorados e o fósforo pode ser reposto por via oral ou parenteral. A causa subjacente da hipofosfatemia também deve ser definida e tratada para que o tratamento seja bem-sucedido.
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O que observar na prática clínica?
Em gatos que apresentam taquicardia, membranas mucosas pálidas, dispneia, pressão arterial baixa ou sinais gerais, incluindo depressão e letargia de duração variável, a anemia deve ser considerada. Um histórico clínico detalhado acompanhado de um hemograma completo é o mínimo necessário para orientar o diagnóstico, que deve sempre se concentrar em determinar a causa subjacente da anemia e estabelecer sua gravidade.
As anemias hemolíticas são uma das principais causas de morbidade e mortalidade em gatos, com prognóstico variando de acordo com a causa associada e a gravidade do caso.
Então, como tratar os gatos diagnosticados com anemia hemolítica?
Há muitas causas associadas a um diagnóstico de anemia hemolítica. Em 2019, o Colégio Americano de Medicina Interna Veterinária (ACVIM) publicou uma diretriz clínica baseada em evidências, focada no diagnóstico e na triagem da AHIM em animais de estimação. Essa diretriz foi criada para dar suporte aos veterinários durante o processo de diagnóstico.
Embora o diagnóstico e o tratamento da anemia hemolítica em gatos possam ser complicados, a abordagem terapêutica deve se concentrar na eliminação da doença subjacente e na interrupção da destruição das células vermelhas do sangue. O tratamento inclui terapia de suporte para aumentar a capacidade de transporte de oxigênio, o que é vital para aumentar a sobrevivência dos pacientes afetados.
Em casos graves, uma transfusão de sangue deve ser administrada enquanto a causa da anemia hemolítica é determinada. Em casos de AHIM primária (ou idiopática), foram recomendados agentes imunossupressores, incluindo glicocorticoides, ciclosporina ou clorambucil, administrados como monoterapia ou em combinação. Nos casos de AHIM secundária, a chave é identificar a causa do dano aos glóbulos vermelhos para elaborar um plano de tratamento personalizado.
Atualmente, há poucas evidências sobre o tratamento da anemia hemolítica em gatos. Entretanto, o diagnóstico precoce e o início imediato de um tratamento abrangente, combinando terapia de suporte e tratamento específico do fator desencadeante da anemia, quando conhecido, podem melhorar o prognóstico e a sobrevivência do paciente.
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