Pets

Gravidez e Toxoplasmose

     Conselhos aos clientes

A toxoplasmose é uma zoonose que pode ser transmitida verticalmente ao feto se uma mulher grávida for infectada. Como veterinários clínicos devemos esclarecer todas as dúvidas que surjam às nossas clientes que vão conviver com gatos durante a gravidez.

 O que é a toxoplasmose?

A toxoplasmose é uma infecção causada pelo parasita chamado Toxoplasma gondii que afeta qualquer animal de sangue quente, inclusive o ser humano.

Por que é um problema em gatos?

O parasita é eliminado pelas fezes dos felinos. Os gatos e todos os outros felinos são os únicos hospedeiros definitivos do Toxoplasma gondii. Ou seja, são os únicos animais onde o parasita completa seu ciclo de vida.

Como gatos e humanos pegam toxoplasmose?

Os gatos a contraem comendo uma de suas presas infectadas ou carne crua ou mal cozida.

Os humanos geralmente a contraem comendo carne crua ou mal cozida ou vegetais contaminados (mal lavados).

Posso conviver com o meu gato se estiver grávida?

A resposta é Sim.

É necessário apenas seguir medidas básicas de higiene, como manter a caixa de areia limpa limpando-a todos os dias, pois o parasita se torna infeccioso 1 a 5 dias após ser eliminado nas fezes. Usar luvas ao limpá-la ou peça a outro membro da família que o faça. 

Lembre-se que o contágio em humanos ocorre principalmente através de carne contaminada, mal cozida ou crua, ou vegetais contaminados que foram mal lavados.

Aspectos gerais

A toxoplasmose é uma infecção causada por um parasita unicelular denominado Toxoplasma gondii, sendo uma zoonose de grande importância médica e veterinária.1–4

  • O Toxoplasma gondii apresenta alta prevalência, afetando aproximadamente um terço da população mundial.
  • A replicação ocorre no intestino de gatos e outros felinos, que são os únicos hospedeiros definitivos.
  • Os animais de sangue quente (mamíferos e aves) e os humanos são hospedeiros intermediários.
  • A toxoplasmose pode causar doenças graves em humanos de todas as idades, principalmente em pacientes imunodeprimidos e recém-nascidos.
  • O parasita Toxoplasma gondii é transmitido por diversas vias.5
  • A incidência de toxoplasmose é maior em áreas tropicais do que em áreas frias ou secas.

Toxoplasmose no gato

Os gatos são os animais mais importantes na epidemiologia da toxoplasmose, pois são os únicos hospedeiros que podem excretar pelas fezes, oocistos que podem contaminar a água, o solo e as lavouras.6 Isso torna os gatos domésticos que não saem de casa menos susceptíveis à contaminação se comparados aos gatos que vivem na rua ou na zona rural.5 Os felinos são os únicos mamíferos que não possuem atividade da delta-6-desaturase intestinal, o que resulta em excesso sistêmico de ácido linoléico, permitindo o desenvolvimento sexual do Toxoplasma gondii no intestino do gato. Isso explicaria por que os gatos ou felinos são os únicos hospedeiros definitivos desse parasita.6–8

Os felinos são infectados quando ingerem esses cistos após predarem um hospedeiro intermediário. Após a ingestão pelo gato, os bradizoítos são liberados dos cistos teciduais e se reproduzem assexuadamente dentro do epitélio do intestino delgado do gato, e, à sequência, ocorre a reprodução sexuada e produção de oocistos.

A parede do oocisto é extremamente resistente a agressões ambientais e químicas, permitindo que o parasita seja liberado incólume nas fezes do hospedeiro felino. Isso resulta na formação de oito esporozoítos infecciosos haploides, contidos em dois esporocistos (ou seja, quatro esporozoítos por esporocisto), dentro de um oocisto.6,7  O gato começará a eliminar milhões de oocistos em suas fezes. No entanto, os oocistos são eliminados por um curto período de tempo, geralmente menos de 21 dias, antes que a resposta imune bloqueie completamente a produção de oocistos. Os oocistos eliminados nas fezes de um gato não são imediatamente infecciosos para outros animais e devem passar por um processo chamado esporulação primeiro. Nas caixas de areia, a esporulação ocorre em um período de 1 a 5 dias e, no solo ou na água, os oocistos resultantes podem permanecer viáveis ​​por muitos meses ou mesmo anos.9

Saiba mais sobre o portfólio de produtos e soluções da MSD Saúde Animal para pets.

Toxoplasmose em humanos

Os oocistos eliminados nas fezes do gato, uma vez esporulados (1-5 dias) são infecciosos para outros gatos, pessoas e outros hospedeiros intermediários.9

Os oocistos infecciosos estão em toda parte e podem contaminar a água, o solo, as frutas ou os vegetais. As fontes mais comuns de infecção para humanos são o consumo de carne mal cozida, a ingestão de alimentos ou água contaminados com oocistos esporulados e a transmissão congênita.10 

A seguir, são descritas as diferentes vias pelas quais a infecção pode ocorrer no ser humano ou hospedeiros intermediários:5 

  • Ingestão de água, vegetais e frutas contaminadas com oocistos viáveis, esporulados depois da excreção prévia nas fezes dos gatos.
  • Ingestão de carne crua ou mal cozida que contenha cistos teciduais viáveis.
  • Transmissão congênita da mãe através da placenta.
  • Transfusão de sangue.
  • Transplante de órgãos contaminados com cistos ou taquizoítos.

A infecção pelo parasita pode dar origem a uma ampla gama de sinais clínicos dependendo da espécie animal hospedeira, podendo ser fatal em algumas espécies de mamíferos marinhos e marsupiais. No entanto, apenas uma pequena porcentagem de humanos ou outros animais expostos (incluindo o gato) desenvolvem sinais clínicos. Após a ingestão de bradizoítos em cistos teciduais ou em oocistos esporulados provenientes de fontes de água, solo e vegetação contaminadas, o Toxoplasma gondii também apresenta um ciclo de vida extraepitelial que ocorre em gatos e outros hospedeiros intermediários. Uma vez no estômago, oocistos e cistos teciduais contendo bradizoítos são digeridos para liberar esporozoítos. Estes são capazes de infectar células do intestino delgado, resultando na produção de taquizoítos de rápida multiplicação que se propagam pela circulação sanguínea e linfática antes de se localizarem nos tecidos. Os cistos são mais comumente encontrados no músculo esquelético, miocárdio, órgãos viscerais e SNC. Uma vez in situ, os taquizoítos se desenvolvem em cistos teciduais contendo bradizoítos. Os cistos teciduais permanecem no hospedeiro por toda a vida e são infecciosos para gatos, pessoas e outros hospedeiros intermediários se ingeridos. O ciclo de vida extraepitelial não resulta na produção de oocistos. 9

Complicações, quem é afetado

As complicações mais perigosas da toxoplasmose ocorrem em pacientes cuja imunidade foi deprimida por tumores malignos e terapia antitumoral, portadores da síndrome de imunodeficiência adquirida ou usuários de drogas imunossupressoras após transplante de órgãos. Além disso, em caso de infecção materna adquirida durante a gravidez, o toxoplasma pode infectar o feto com grau variável de severidade, dependendo do trimestre em que a gestante adquiriu a infecção.10

Gravidez e Toxoplasmose

A toxoplasmose congênita ocorre quando a infecção materna é adquirida pela primeira vez durante a gravidez. Durante a fase de parasitemia, o Toxoplasma gondii pode atravessar a placenta e entrar na circulação do feto ocasionando um risco variável de infecção fetal a depender da idade gestacional. O risco de infecção congênita é menor quando a infecção materna ocorre durante o primeiro trimestre (10-15 %) e maior quando a infecção ocorre durante o terceiro trimestre (60-90 %). No entanto, a infecção congênita mais grave geralmente ocorre durante o primeiro trimestre.1,10

O diagnóstico da toxoplasmose geralmente é feito por testes sorológicos. Um teste que mede a imunoglobulina G (IgG) é usado para determinar se uma pessoa foi infectada. Se for necessário tentar estimar o momento da infecção, o que é especialmente importante para mulheres grávidas, poderá ser empregado teste para medir a imunoglobulina M (IgM) em conjunto com outros como o teste de avidez.1

Se há tantos riscos para a gestante, ela deveria desistir de ter um gato?

A resposta é NÃO

O gato só infecta se estiver eliminando os cistos ativamente. Além disso, mesmo se o gato os eliminar, os oocistos não são infecciosos imediatamente, podem passar entre 1 e 5 dias desde que o cisto foi expelido.9 

Recomendações do CDC (Centers for Disease Control and Prevention) para reduzir drasticamente o risco de infecção em mulheres grávidas:11

  • Se possível, evite trocar a areia dos gatos. Se ninguém mais puder realizar a tarefa, use luvas descartáveis ​​e lave as mãos com água e sabão após a troca da areia.
  • Limpe a caixa de areia do gato diariamente e mantenha cobertas as caixas de areia que estejam ao ar livre.
  • Alimente o gato com alimentos comerciais secos ou enlatados evitando carnes cruas ou mal cozidas.
  • Se houver gatos em casa, eles devem sempre ser mantidos dentro da residência.
  • Evite gatos vadios. Não adquira um novo gato enquanto estiver grávida.
  • Use luvas ao trabalhar no jardim e durante o contato com terra ou areia, pois podem estar contaminadas com fezes de gato.
  • Lave as mãos com água e sabão após a jardinagem ou contato com terra ou areia.
  • Congele as carnes em temperaturas abaixo de zero pelo menos 48 horas antes de cozinhar.
  • Certifique-se de que a carne que você come está bem cozida.
  • Lave legumes e frutas e desinfete-os.
  • Os cães podem contrair, mas não transmitem a infecção aos humanos.

 Diagnóstico e tratamento em gatos

Diagnóstico

Os testes de anticorpos em gatos não são muito úteis para evidenciar a toxoplasmose clínica. No entanto, se forem negativos, podem ser usados ​​para descartar a doença. O diagnóstico antemortem da toxoplasmose clínica deve ser baseado na detecção do organismo em biópsias musculares ou lavagens broncoalveolares e é aprimorado pelo uso de imunohistoquímica ou histologia imunofluorescente. O PCR pode ser usado para confirmar a identidade de taquizoítos ou cistos teciduais, mas falsos positivos podem ser obtidos em gatos saudáveis, portanto o PCR não é muito confiável.9

Tratamento

O tratamento de escolha é a clindamicina (10 a 12,5 mg/kg por via oral a cada 12 horas por 4 semanas) e geralmente produz uma resposta rápida (normalmente em uma semana). O tratamento geralmente promove uma rápida melhora clínica e pode resultar na resolução completa dos sinais clínicos. No entanto, a eliminação completa do parasita provavelmente não é possível e podem ocorrer recorrências.9

Referências

1. Bollani L, Auriti C, Achille C, et al. Congenital Toxoplasmosis: The State of the Art. Front Pediatr 2022;10:1–12.

2. Dubey JP, Cerqueira-Cézar CK, Murata FHA, et al. All about toxoplasmosis in cats: the last decade. Vet Parasitol 2020;283:109145.

3. Dubey JP, Murata FHA, Cerqueira-Cézar CK, et al. Congenital toxoplasmosis in humans: an update of worldwide rate of congenital infections. Parasitology 2021;148:1406–1416. Available at: https://www.cambridge.org/core/journals/parasitology/article/abs/congenital-toxoplasmosis-in-humans-an-update-of-worldwide-rate-of-congenital-infections/9F93C320D13EE165EB82D62936D4C777. Accessed October 30, 2022.

4. Vargas-Villavicencio JA, Cañedo-Solares I, Correa D. Anti-Toxoplasma gondii IgM Long Persistence: What Are the Underlying Mechanisms? Microorganisms 2022;10:1–18.

5. Attias M, Teixeira DE, Benchimol M, et al. The life-cycle of Toxoplasma gondii reviewed using animations. Parasit Vectors 2020;13:1–13. Available at: https://doi.org/10.1186/s13071-020-04445-z. Accessed October 30, 2022.

6. Smith NC, Goulart C, Hayward JA, et al. Control of human toxoplasmosis. Int J Parasitol 2021;51:95–121.

7. Tong WH, Pavey C, O’handley R, et al. Behavioral biology of Toxoplasma gondii infection. Parasites Vectors 2021;14:1–6. Available at: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/.TheCreativeCommonsPublicDomainDedicationwaiver. Accessed October 30, 2022.

8. Martorelli Di Genova B., Wilson Sarah K., Dubey J. P., et al. Intestinal delta-6-desaturase activity determines host range for Toxoplasma sexual reproduction. PLoS Biol 2019;17:e3000364. Available at: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31430281/. Accessed November 3, 2022.

9. Caney S. Update on feline toxoplasmosis. In Pract 2021;43:135–141.

10. Hernández-Cortazar I, Acosta-Viana KY, Ortega-Pacheco A, et al. Toxoplasmosis en México: Situación epidemiológica en humanos y animales. Rev Inst Med Trop Sao Paulo 2015;57:93–103.

11. CDC – Centers for Disease Control and Prevention. CDC – Toxoplasmosis – General Information – Pregnant Women. Centers Dis Control Prev 2020.

Newsletter Universo da Saúde Animal

Sua fonte especializada de informações relevantes sobre Saúde Animal. Inscreva-se
gratuitamente e tenha acesso a atualizações veterinárias no Brasil e no mundo.